Novas drogas – a controvérsia em torno das ‘smart’shops
As drogas legais são cada vez mais procuradas pelos jovens em Portugal, como alternativa às drogas tradicionais. São mais baratas, de fácil acesso e a compra dos produtos não é punida por lei. No entanto, o Ministério da Saúde registou, em dois meses, 34 casos de complicações devido ao consumo de drogas legais.
Em 2007 abriu a primeira smartshop em Portugal. Assim se designam as lojas que comercializam as chamadas ‘drogas legais’, substâncias ainda não regulamentadas pelo Estado que, ao serem consumidas de determinadas maneiras, produzem efeitos semelhantes aos da cocaína, do ecstasy ou da cannabis. A maior parte das substâncias que compõem as drogas legais fazem parte da família de substâncias proibidas; é através da alteração da sua estrutura molecular que se cria uma nova substância – cuja comercialização não é proibida. A velocidade com que estas novas substâncias surgem torna difícil o controlo das mesmas, bem como a sua regulamentação por parte do Estado. De acordo com o Observatório Europeu da Droga e Toxicodependência (OEDT) só em 2011 foram identificadas 49 novas substâncias psicoactivas.
Hoje contam-se já 40 smartshops em todo o país. O sucesso que estas lojas tiveram, principalmente, junto dos jovens portugueses, facilitou a sua proliferação em Portugal. O facto de ser uma loja aberta ao público cria nas pessoas uma certa sensação de segurança, de confiança, no produto que estão a comprar. Em relação às drogas ilegais, evita-se recorrer ao mercado paralelo e paga-se menos pelo produto pretendido. Além disto, as lojas estão abertas até tarde e algumas chegam mesmo a disponibilizar oferta ao domicílio. Parece ser uma boa opção para quem pretende recorrer a estupefacientes.
No entanto, os produtos vendidos nestas lojas dizem não ser para consumo humano. Este é um dos argumentos daqueles que se posicionam contra as drogas legais: as etiquetas desaconselham o consumo humano, mas os vendedores das smartshops dão indicações aos clientes sobre como as usar. Se comprarmos um incenso, aconselham a fumá-lo com tabaco, no caso de outras drogas aconselham a inalação. Maria (nome fictício) tem 22 anos e trabalha numa smartshop recém-aberta, na zona do Cais do Sodré. Questionada sobre este assunto, Maria responde: ‘foi uma forma inteligente do dono da primeira loja, chamar fertilizantes para plantas. Ele procurou na lei e descobriu uma forma de a contornar. Se dissesse que era para consumo humano, já não era legal’. A verdade é que quem pode comprar nestas lojas tem de ter pelo menos 18 anos, e é esperado que as pessoas assumam a responsabilidade daquilo que compram e da forma como o consomem.
Apesar das recomendações supostamente fornecidas por parte das smartshops, registaram-se em dois meses 34 casos de pessoas que sofreram complicações após consumirem drogas legais – dos quais 16 resultaram em internamento e 2 em coma. Maria considera que os casos que correram mal aconteceram porque as pessoas ‘não sabiam consumir’.
As ocorrências na Madeira
Entre Janeiro e Agosto de 2012 houve 4 mortes no arquipélago da Madeira, que se acredita estarem relacionadas com o consumo de drogas legais. Nelson Carvalho, responsável pelo programa de prevenção em comportamentos aditivos da Madeira, disse no passado Novembro ao semanário SOL que ‘todos os dias, há três a quatro episódios de urgência relacionados com as novas drogas’. De Janeiro a Setembro de 2011 foram internadas 170 pessoas numa casa de saúde mental do Funchal, devido à ocorrência de surtos psicóticos após o consumo de drogas legais.
Todos estes acontecimentos levantaram a polémica em torno das drogas legais, que na realidade nunca tinham sido até àquele momento regulamentadas em Portugal. Na região autónoma da Madeira entrou em vigor, no final de Outubro, um decreto de lei que proíbe a venda, importação, exportação e publicitação das chamadas drogas legais. A maior parte das lojas existentes na ilha fecharam por iniciativa própria. Porém, a nova lei determina que se as smartshops venderem outros produtos que não estas drogas, podem continuar abertas.
Depois de esta lei ter entrado em vigor na Madeira, muitas vozes se levantaram para que no continente se procedesse da mesma maneira. O conhecimento dos casos passados no arquipélago, principalmente os casos de morte, fez com que este assunto ganhasse a atenção do Estado. Neste momento espera-se que sejam tomadas medidas, já prometidas pelo actual governo, para regulamentar as drogas legais.
Nova legislação
Chegou-se a falar no encerramento das smartshops. No entanto, não é isso que irá acontecer. A legislação está a ser feita pelo Estado em conjunto com o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e Dependências (SICAD), e pretende-se que haja um maior controlo sobre as smartshops e sobre as substâncias lá comercializadas. Tendo em conta a velocidade com que estas novas substâncias aparecem, irão ser proibidos grupos de substâncias – as drogas legais são principalmente constituídas por 3 categorias de substâncias psicoactivas (catinonas sintéticas, canibinoides sintéticos e piperazinas). Está também a decorrer um processo de registo dos casos que apareceram nas urgências por consumo de drogas legais. O objectivo é, segundo o presidente do SICAD João Goulão, proteger a saúde pública. Por isso, uma das medidas será a de submeter todas as substâncias que vão aparecendo a uma espécie de quarentena – no caso de se verificarem perigosas para a saúde, são ilegalizadas.
Os responsáveis pelas smartshops queixam-se de não serem ouvidos, de nunca terem sido abordados por parte do Estado para que houvesse regulamentação. Muitos dizem até que concordam que devia haver leis, para que então pudessem realizar a sua actividade sem problemas. Mas a verdade é que se muitas substâncias forem retiradas do mercado, estas lojas não têm por onde sobreviver.
Jessica e Daniel, com 20 e 22 anos, falam acerca da sua experiência com drogas legais:
"Nuno"trabalha na smartshop "Wonderland" e aceitou responder a algumas questões sobre o tema das drogas legais.
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