Joel Hasse Ferreira mostra-se favorável à aplicação nas tabernas portuguesas do regulamento comunitário sobre a higiene dos géneros alimentícios. De acordo com o deputado europeu, «é preciso garantir a segurança alimentar. E as pessoas não prescindem disso pelo tipicismo».A nova lei entrou em vigor em Janeiro deste ano. Entre as suas exigências estão a “formação adequada” e os “processos eficazes de vigilância em pontos críticos de controlo” nos estabelecimentos em que haja manuseamento de produtos alimentares.
De acordo com Hasse Ferreira, “nas tasquinhas e tabernas, o conhecimento da lei não é profundo”. A razão é o facto de em Portugal a comunicação social não dar relevo suficiente a estes temas, “mesmo em questões importantes para a saúde pública”.
A adaptação das leis também tem dificultado a sua aplicabilidade. Segundo o deputado europeu, Portugal é “dos países que mais demora a transpor a legislação comunitária”. E isso cria “insegurança a nível jurídico, nos negócios e nos consumidores”, explica.
A nova Autoridade para a Segurança Alimentar e Económica é uma das soluções apresentadas por Hasse Ferreira. A certificação de consultores para apoiar as pequenas empresas é outro dos caminhos apresentados.
“O esforço de acompanhar os pequenos estabelecimentos e formar as pessoas não vai ser pequeno”, afirma o deputado europeu. Mas “manter a especificidade de uma cultura também passa pela gastronomia e por manter serviços deste tipo”, sublinha.
Texto de Luís Miguel Abreu e Ricardo Leal Lemos
(Em baixo, a entrevista na íntegra)
Em 2004 foi criada a Liga dos Amigos das Tabernas Antigas (LATA), que se manifesta contra esta lei. Como pode este organismo influenciar a sua aplicação?
Em primeiro lugar, sou contra os que são contra. É preciso garantir a qualidade e a segurança alimentar. E as pessoas não prescindem disso por razões de tipicismo. O que é mais útil para defender o que é típico passa por ver o que não está bem e sugerir alterações.
Ser contra tem graça. Mas isto é aplicável. E não vamos dizer aqueles que não são contra para não aplicarem.
As especificações técnicas da lei apenas são referidas nos anexos. Isto não provoca dificuldades na leitura da legislação que sai do Parlamento Europeu?
Isso tem a ver com o processo de trabalho do Parlamento Europeu. No Parlamento, os textos são feitos pelos deputados e eventualmente, são verificadas por juristas. Os anexos são feitos por técnicos e as pessoas têm tendência para não olhar para eles.
É difícil um compromisso entre vários países, e por isso, procura-se muitas vezes um entendimento a nível político. Quando a legislação é transcrita, depende do funcionamento técnico-legislativo de cada país.
Seria preferível a adaptação desses elementos na transcrição nacional da lei?
Era importante que fosse feita. Mas Portugal tem sido dos países que mais demora a transpor a legislação internacional. Muitas vezes ultrapassando o prazo máximo dado pela UE. E isso cria insegurança a nível jurídico, nos negócios e nos consumidores.
Nas tabernas antigas, as pessoas conhecem lei?
Julgo que a informação chega com velocidades diferentes. Em países como a Bélgica, a Holanda, a Alemanha, Dinamarca, Suécia, Inglaterra, chega muito rápido porque a grande imprensa e a televisão dão muita importância a estes assuntos. Em Portugal, não se dá grande importância a isso, mesmo em questões que são importantes para a saúde pública. Essa experiência é para mim uma desilusão. Na Assembleia da República, informa-se muito mais que no Parlamento Europeu.
Nas tasquinhas e tabernas, o conhecimento não é profundo. Mas a formação a nível hoteleiro e dos profissionais que efectuam a manipulação dos alimentos é fundamental
E nesse campo, já foi feito algum trabalho?
Muito pouco. Admito que com a nova Autoridade para a Segurança Alimentar e Económica (ASAE) tudo possa melhorar.
Mas o decreto que a criou entrou em vigor no dia 2 de Janeiro, sem que exista qualquer estrutura ou direcção.
A integração destes organismos diversos na administração pública nem sempre é fácil. A mudança de ministério (da agricultura para a economia) pode trazer outra dinâmica.
Agora, o esforço de acompanhar os pequenos estabelecimentos e formar as pessoas não vai ser pequeno e o enquadramento teórico não vai ser aplicado a cem por cento. A ARESP está a criar um mecanismo de certificação de consultores que trabalham nestes nichos para apoiar as empresas. É um caminho que está em curso, mas ainda muito no início.
Uma das formas de assegurar o controlo destes estabelecimentos passará por favorecer o seu interesse turístico?
Talvez. Mas em algumas regiões do país, os turistas queixam-se do facto de em alguns estabelecimentos a qualidade não ser evidente.
Então como é possível fazer a renovação destes estabelecimentos?
Tal como existem apoios para o urbanismo comercial, há para esta área. E esta questão é pelo menos tão importante como a outra. As empresas podem beneficiar dos serviços
de um consultor nesta área, através da ASAE ou do IAPMEI.
Tem uma visão positiva do mercado, neste sentido?
Sim. Porque no futuro, vamos ter cada vez mais grandes cadeias de franchisados mas manter a especificidade de uma cultura também passa pela gastronomia e por manter serviços deste tipo. E as pessoas gostam destas coisas diferentes, mas com algum controlo.
Seria possível exportar o nosso modelo, à semelhança do espanhol?
Sim, e contando com o apoio de milhões de portugueses espalhados por um vasto conjunto de países como a Venezuela, Brasil, Bélgica, Alemanha ou França.
O que podem fazer os deputados europeus para ajudar nesta tarefa?
Intervenções políticas e iniciativas tácticas. Isto é, criar eventos, semanas temáticas e capanhas de divulgação que permitam evidenciar a originalidade e qualidade dos estabelecimentos portugueses na Comissão Europeia.