Texto nº1

Quando a realeza desceu do céu,

a realeza fixou-se em Eridu.

(...)

O dilúvio passou por cima de tudo. Depois do dilúvio haver passado por cima

de tudo,

a realeza – uma vez que a realeza havia descido do céu – fixou-se em Kish.

(...)

(«Lista Real sumeria»: Sanmartín, Joaquín e Serrano, José Miguel, História Antigua del Próximo Oriente. Mesopotamia y Egipto, Madrid, Akal, 2006, p.25)  

 

 Texto nº2

 

Eu sou o rei, o bem criado, de boa semente por parte de mãe, o filho do divino Enlil. Qual rebento de cedro que levanta orgulhoso a cabeça, sou um homem de força poderosa, de potência invencível. Na minha juventude, espreguiço-me com força: sou um leão que a todos precede, não tenho rival; sou um dragão que abre a sua garganta, o terror do exército (inimigo); sou a águia Imdugud, que sobrevoa os montes; um touro que comanda a manada e ao qual ninguém resiste; um bisonte brilhante, de olhos reluzentes. Tenho uma barba de lápis lázuli, tenho bons olhos, boa boca, sentidos lúcidos, possuo a figura do um leão selvagem, adornado com generosa beleza; sou o adorno de todas as palavras (...)

Sou o filho amado do divino Enlil; no seu templo Ki'ur, entregou-me o ceptro. Sou a delícia da divina Ninlil; no seu templo Gagishshu'a, fixou-me um bom destino (...). Eu sou aquele a quem o divino Lua (Nanna) olhou com carinho; falou-me amistosamente em Ur (...). Eu sou aquele a quem o divino Enki abriu o ouvido; ele concedeu-me a realeza em Eridu. Eu sou o esposo querido [da divina Inanna]; na cidade de Uruk, fez com que eu, orgulhoso, levantasse para o céu minha cabeça (...). Eu sou a jóia do reino, Lipit-Ishtar, filho do divino Enlil.

Eu sou o que leva o cajado de pastor, sou a vida do país de Sumer; eu sou o lavrador que amontoa o grão, o pastor que multiplica a gordura e o leite do rebanho, que cria pássaros e peixes no sapal, que enche de água perene as correntes dos rios, que traz os produtos da Grande Montanha.

Eu sou aquele a quem o divino Enlil doou uma imensa força, eu sou Lipit-Ishtar, que na minha juventude o adorou. Eu sou o que está sempre ao serviço dos deuses, o que cuida sem cessar do (templo) Ekur; o rei que se acerca do sacrifício com um cabrito ao peito, que, humilde, leva (orando) a mão à boca; o rei que se apresenta na oração, que diz ao divino Enlil palavras agradáveis, que satisfaz a divina Ninlil com sua prece (...).

Eu sou o que proporciona à sua cidade seres vivos, Lipit-Ishtar, pastor de todos os povos. Eu sou o rei que aplaca na batalha a sua vontade de combater, que nunca tira a couraça que pôs quando era ainda criança, que cinge a espada fulminante, a qual brilha na batalha como o raio (...), o herói de brilhante expressão que combate gritando, Lipit-Ishtar, filho do divino Enlil.

Eu sou aquele que enche os odres de água fresca, o que organiza as campanhas, o auxílio do exército; rei feito à medida do alto trono, de entendimento profundo, que pronuncia a palavra justa (...), o que põe o direito nas bocas de todos, que sustenta sempre os justos, que dita nos pleitos e nos julgamentos a sentença justa, que sabe comandar todos os países estrangeiros. Eu decidi que deve haver justiça em Sumer e em Akkad, que o país deve prosperar: quem pode opor-se à minha decisão? Eu, Lipit-Ishtar, conduzi a meu povo: quando poderá ser anulada minha sentença? (...)

 

(Hino sumério de Lipit-Ishtar, ca. 1934-1924; Sanmartín, Joaquín e Serrano, José Miguel, História Antigua del Próximo Oriente. Mesopotamia y Egipto, Madrid, Akal, 2006, pp. 58-60)